Sou mulher. Posso dar origem a outros seres e tenho sido conotada ao longo da história como sexo fraco, que serve apenas para tomar conta das crianças, mas não para liderar nem para tomar decisões difíceis. Essas estão reservadas aos homens, mais fortes fisicamente e intelectualmente mais aptos a liderar. Esta é a nossa triste realidade, ainda nos dias de hoje.
Continuamos a ser menos em cargos de liderança, continuamos a não ter os mesmos salários, continuamos a ter menos voz nas várias áreas da sociedade, continuamos a ter homens que querem regular quais são os direitos que temos em relação ao nosso corpo. Continuamos a ter empresas que perguntam, na fase da contratação, se temos ou queremos vir a ter filhos.
Se vivermos num país como Portugal, por exemplo, em que já nos é permitido ter uma carreira, apercebemo-nos de que estamos aprisionadas entre a vontade de ter carreira e a culpa em falharmos no acompanhamento aos nossos filhos e família, precisamente porque queremos ter uma carreira. Temos de ser boas profissionais, boas mulheres, boas mães, acabando por ser esmagadas por este peso absolutamente estrondoso de culpa e de excesso de responsabilidade, porque é-nos exigido tudo.
Temos uma carreira, mas também temos de tomar conta dos filhos, preparar as refeições, ter a casa limpa e arrumada, estar lindas e maravilhosas, não engordar, fazer exercício, ter tempo para os amigos e não ser apenas mães e mulheres trabalhadoras. Ou então temos uma carreira, mas não temos filhos nem família, e ainda somos consideradas estranhas nesta sociedade, por nos desviarmos do que é suposto. E a lista podia continuar.
Uma amiga falou-me de uma conta do Instagram e, desde que esbarrei nela, estou viciada. Chama-se @themanwhohasitall e tem por protagonista um homem, que ergue a voz, de forma irónica e com algum sentido de humor, para demonstrar como ainda temos um longo caminho a percorrer no que diz respeito à igualdade entre os géneros. Dou alguns exemplos:
- As pessoas dizem-me com frequência: “tens a tua mulher muito bem treinada”, porque ela ajuda-me com a lida da casa. É verdade. Tenho tanta sorte.
- Serão os homens demasiado emocionais para lidar com assuntos políticos?
A ideia é genial. A melhor forma de fazer homens e mulheres se aperceberem do desequilíbrio que ainda persiste nas nossas sociedades — para aqueles que não o veem — é invertendo os papéis. E se os homens se queixassem dos problemas que hoje em dia afetam as mulheres?
A verdade é esta: temos ainda um longo caminho a percorrer. Temos de nos libertar destas amarras a que estamos sujeitas e aceitar que a perfeição não existe. Que conseguimos fazer o melhor que conseguimos. Que podemos e devemos lutar para ter mais, sem o peso e a culpa de, à conta disso, negligenciarmos ou escolhermos não apostar em algumas partes das nossas vidas.
Até quando vamos continuar presas às convenções — as nossas e as dos outros? Até quando vão continuar a prender-nos às convenções? Até quando vamos continuar presas a estereótipos: do que é suposto e aceitável fazermos, do que devemos fazer? Até quando vamos continuar a não ser livres?